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sexta-feira, 22 de junho de 2012

Banco de Portugal entra na campanha ideológica pela baixa dos salários em Portugal e no ataque aos sindicatos

por Eugénio Rosa

O Banco de Portugal divulgou recentemente um "estudo", depois utilizado pelos media, que procura criar na opinião pública a ideia de que o aumento do desemprego se deve à rigidez dos salários. O dito estudo vem na linha do comunicado da troika, divulgado após a 4ª avaliação de Junho de 2012, que afirma que a subida do desemprego em Portugal " foi exacerbada pela antiga rigidez do mercado laboral português ". A "cassete" habitual do FMI e seus defensores quando recusam a realidade.

O Banco de Portugal é um banco público pago pelos portugueses. É o banco cuja função é supervisionar o sistema financeiro. Apesar disso, por falta de competência ou por ter pactuado, deram-se casos como o BPN e BPP que já custaram aos contribuintes portugueses mais de 5.000 milhões de euros. Mas as consequências negativas da actuação do Banco de Portugal não se restringem apenas a estas. Tal como aconteceu em outros países, e contrariamente à mensagem que os banqueiros e os seus defensores têm pretendido fazer passar junto da opinião pública, também em Portugal verificou-se má gestão, para não dizer mesmo gestão irresponsável por parte da banca. A prová-lo está o facto de que a maioria dos bancos "portugueses" não consegue obter crédito no mercado internacional a não ser com o aval do Estado (é por isso, que no OE-2012 estão inscritos 35.000 milhões de euros para avales à banca) e, mais recentemente, a recapitalização dos principais bancos em mais de 6.000 milhões de euros com fundos do Estado. Afirmar perante estes factos que os bancos em Portugal tiveram e têm uma gestão diferente (recorde-se, a este propósito, o caso BPI que teve um prejuízo de 339 milhões de euros por especular com a divida grega); repetindo, dizer neste contexto que a gestão da banca em Portugal é diferente da dos outros países só pode ser conversa para enganar a opinião pública. E tudo isto aconteceu devida à incapacidade, para não dizer mesmo incompetência do Banco de Portugal em exercer, adequadamente, a sua função de supervisor – o que causou e continua a causar graves prejuízos aos contribuintes portugueses e à economia nacional.

O Banco de Portugal não cumpre adequadamente a sua função de supervisão (recorde-se que o actual governador do Banco de Portugal foi director do BCP no tempo da gestão de Jardim Gonçalves que está agora a ser julgado pelos tribunais). No entanto o BP é pródigo em publicar " working papers " (documentos de trabalho, ou hipóteses de trabalho para utilizar as palavras do ministro das Finanças a propósito da reposição do subsidio de ferias e de Natal). Ele entra assim na campanha ideológica da direita para baixar ainda mais as condições de vida dos trabalhadores portugueses. Tudo à semelhança daquilo que é bem retratado, a propósito das responsabilidades dos economistas pela actual crise, no filme Inside job . As escandalosas remunerações que continuam a ser pagas aos administradores dos grupos económicos e financeiros assim como os elevados lucros sem pagamento de impostos distribuídos aos seus maiores accionistas, em plena crise, não merecem qualquer comentário pelos mesmos "técnicos". Dois pesos e duas medidas.

Antes, foi a defesa da desvalorização fiscal através de uma redução significativa das contribuições patronais. Se fosse implementada determinaria ou o colapso da Segurança Social ou um aumento elevado dos preços provocado pela subida do IVA, sem ter qualquer efeito no aumento da competitividade das empresas. Agora, é a "teoria" de que existe rigidez dos salários em Portugal, e que essa rigidez é a causa do aumento do desemprego. Com esse objectivo, divulgou em Maio deste ano um "working paper" com o elucidativo título: " Wage rigidity and employment adjustment at the firm level: Evidence from survey data ". Para procurar credibilizar as conclusões deste "documento de trabalho", para além de ser divulgado através do Banco de Portugal, também refere que tem como base uma investigação baseada em dados.

UM INQUÉRITO VICIADO E UMA AMOSTRA ENVIESADA

Uma leitura atenta do documento divulgado, que depois foi utilizado por alguns media para alimentar a campanha da direita contra os salários dos trabalhadores portugueses (apesar de serem baixos, ainda querem reduzi-los mais com a justificação não provada que assim se aumentaria a competitividade das empresas), leva às seguintes conclusões: (1) O inquérito utilizado para obter os dados referidos é viciado logo à partida porque inclui apenas perguntas com o objectivo de chegar às conclusões que se pretendem obter; (2) A amostra de empresas utilizada é enviesada porque, por um lado, foi obtida sem qualquer rigor estatístico (pelo menos, nada é esclarecido) e, por outro lado, sofre sucessivos cortes para se ajustar as conveniências dos autores; (3) Não existe fundamento cientifico a provar que as variáveis utilizadas, assim como o modelo econométrico usado, sejam adequados à realidade portuguesa.

Comecemos pelo primeiro aspecto. Segundo os autores do documento, o inquérito feito a empresas portuguesas continha apenas as seguintes questões: (1) Nos últimos 5 anos os salários dos trabalhadores foram congelados?; (2) A empresa utilizou algumas das seguintes estratégias para reduzir os custos dos salários: (a) Reduziu ou eliminou bónus ou outros benefícios monetários?; (b) Reduziu ou eliminou benefícios não monetários?; (c) Reduziu ou congelou as promoções?; (d) Recrutou trabalhadores com salários mais baixos para substituir outros com salários mais elevados que saíram da empresa? Todas as outras variáveis (politica do governo, mercado, etc.) são ignoradas.

Uma análise atenta do questionário leva à conclusão imediata que ele está à partida viciado. E isto porque a redução dos custos de trabalho não pode ser analisada desta forma. Os custos do trabalho por unidade produzida (e é esta a que interessa) podem ser reduzidos de muitas formas: (1) Através de uma melhor organização e gestão da empresa; (2) Através de uma política de investimentos adequada; (3) Por meio do pagamento de remunerações mais baixas associada a baixas qualificações; etc.

Os autores do estudo, ao limitarem a redução dos custos do trabalho apenas à redução do valor das remunerações (e as perguntas feitas vão apenas nesse sentido), revelam ou que não compreendem os problemas estruturais das empresas portuguesas (seria bom que, a este propósito, lessem o recente livro do ex-economista chefe do FMI Raghuram Rajan, nomeadamente os efeitos da organização na produtividade nomeadamente do trabalho) ou então quiseram obter resultados de acordo com conclusões pré-definidas. Para além disso, segundo o INE (Empresas em Portugal – 2009), em 2009, nas empresas financeiras, os custos com pessoal representam apenas 15% do valor das vendas. Seria bom que, no lugar de limitar a investigação aos salários (parece que o único inimigo são os baixos salários auferidos pelos trabalhadores portugueses), os economistas do Banco de Portugal estudassem também as outras componentes dos custos, pois certamente nelas se poderiam obter poupanças maiores com uma melhor organização, gestão e investimento.

Para além de tudo isto, a amostra utilizada está também enviesada. Em primeiro lugar não se esclarece quantas empresas foram inquiridas, e com que critérios científicos foram seleccionadas para serem incluídas na amostra estudada (terá sido pela afinidade politica ou ideológica dos proprietários dessas empresas com os autores do estudo?); em segundo lugar, a amostra obtida sofreu uma série de cortes para a ajustar às conveniências dos autores do estudo, pois reduziu 1319 empresas que responderam ao inquérito, a apenas 635 empresas, ou seja, a menos de metade (48%); e, finalmente qual é a representatividade de uma amostra desta natureza e com esta dimensão (nem são fornecidos dados sobre a dimensão das empresas utilizadas no estudo) relativamente a um universo constituído por mais de um milhão de empresas que existem em Portugal, segundo o INE.

UM MODELO ECONOMÉTRICO QUE NÃO ESTÁ PROVADO SER ADEQUADO À REALIDADE PORTUGUESA NEM QUE AS SUAS CONCLUSÕES SEJAM VÁLIDAS.
O ATAQUE AOS SINDICATOS

Não existe evidência científica no estudo divulgado a provar que as variáveis utilizadas, assim como as relações assumidas entre essas variáveis traduzidas no modelo econométrico utilizado sejam adequadas à realidade portuguesa. Em primeiro lugar, porque qualquer modelo econométrico simplifica muito a realidade dando origem, na maioria dos casos, a conclusões que nada têm a ver com a realidade, pois esta é demasiadamente complexa para ser reduzida/traduzida num modelo matemático. Recorde-se, a este propósito, as consequências dos modelos utilizados nos mercados financeiros que contribuíram para a grave crise financeira que depois se transformou na segunda grande recessão económica que enfrentamos actualmente. Toda a gente se recorda ainda da falência estrondosa do hedge fund Long Term Capital Management, onde trabalhavam dois prémios Nobel da economia obtidos precisamente pela elaboração de modelos matemáticos aplicados aos mercados financeiros.

Uma análise mais atenta do modelo utilizado levanta grandes dúvidas sobre a sua adequabilidade à realidade portuguesa assim como sobre a sua consistência técnica. É um modelo essencialmente importado. Muitos dos pressupostos não são pacíficos como o da rigidez das leis do trabalho em Portugal, e isso ser a causa da baixa competitividade da maioria das empresas portuguesas.

Por outro lado, os seus autores assumem também outros pressupostos que pouco têm a ver com a realidade concreta. Ignoram a envolvente da empresa (politica governamental, restrições ao crédito, mercado, etc), e consideram que o maior ou menor número de despedimentos que se verifica numa empresa depende da empresa poder manipular o volume de remunerações, ou seja, desta variável ser flexível. Como os salários base são rígidos, pois são fixados em contratos colectivos por culpa dos sindicatos , então a flexibilidade que a empresa tem para manipular o volume de remunerações fica dependente do seguinte: (a) Possibilidade de congelar os salários contratuais; (b) Possibilidade de reduzir ou eliminar benefícios monetários; (c) Possibilidade de reduzir ou eliminar benefícios não monetários; (d) Possibilidade de substituir trabalhadores que saiam da empresa por trabalhadores com salários mais baixos. E quanto mais elevadas forem estas margens, e maiores forem as possibilidades de as reduzir menor será a necessidade de despedir trabalhadores, ou seja, de reduzir o emprego (" a flexibilidade dos salários base tem um impacto positivo no emprego e este impacto positivo é significativamente fortalecido pela possibilidade das empresas recorrerem ao ajustamento das margens dos custos do trabalho " concluem na pág. 29). Eis a mensagem principal do " working paper " dos economistas do Banco de Portugal.

É evidente que esta mensagem, que se procura credibilizar utilizando o nome do Banco de Portugal e modelos matemáticos de duvidosa aplicação, serve os objectivos actuais da direita já que visa, objectivamente, desresponsabilizar a politica de austeridade que está a ser imposta ao país pelo governo e troika pelo aumento vertiginoso do desemprego, procurando-se desviar a causa para o interior de cada empresa e depois limitá-la, dentro dela, à maior ou menor rigidez das despesas com pessoal, responsabilizando disso os trabalhadores e os sindicatos (" Quanto maior é o poder de negociação dos sindicatos, maior é a rigidez dos salários, e maior serão as mudanças no emprego ", ou seja, maior será o desemprego, pág. 23 do estudo). Para estes "senhores", os contratos colectivos de trabalho como fonte de direitos para os trabalhadores que depois são consagrados na lei, e como instrumento de progresso social e civilizacional não deviam existir. Será desta forma que consideram os contratos em que são beneficiados?

A redução do poder de compra dos portugueses e, consequentemente, a contracção significativa do mercado interno, os cortes significativos no crédito feito pelos banqueiros, a quebra significativa nas vendas e a falência de milhares de empresas, tudo isto provocado pela politica de austeridade violenta imposta pelo governo e pela troika, está a determinar o aumento vertiginoso do desemprego, tudo isto é ignorado no estudo dos economistas do Banco de Portugal, que à semelhança dos economistas retratados no filme " Inside Job " também se prestaram a igual papel.

Para finalizar, interessa ainda referir que apesar de todos os esforços feitos para credibilizar a mensagem que procuram passar, no entanto, na pág. 22 do seu "paper", são obrigados a reconhecer "que quanto mais elevada é a taxa de trabalhadores permanentes, mais se usa o ajustamento das margens " e, consequentemente, menos a redução do emprego.

13 de Junho 2012

Eugénio Rosa, economista

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Crescimento Anémico de Portugal até 2050

O MINISTRO DAS FINANÇAS ENGANA OS PORTUGUESES E RELATÓRIO DO OE-2012 CONFIRMA CRESCIMENTO ANÉMICO DE PORTUGAL ATÉ 2050

O ministro das Finanças, Vítor Gaspar, quando é confrontado com a questão de que as medidas que está a tomar são contraccionistas, e levarão inevitavelmente o país à recessão económica papagueia, de uma forma monocórdica, aquilo que chama “Agenda de transformação estrutural” que, no fundo, se resume ao seguinte: liberalização dos preços; desregulamentação das leis do trabalho; maior facilitação em despedir e diminuição das indemnizações por despedimento; privatização das empresas públicas e sua venda a estrangeiros. Quem conheça minimamente a situação da economia portuguesa sabe bem que um programa desta natureza apenas agravará muito mais a sua situação, e tornará a nossa economia mais dependente do estrangeiro. No entanto, apesar dessa evidência, o ministro das Finanças promete o crescimento económico já a partir de 2012 e a prosperidade para os portugueses. No “Documento de Estratégia Orçamental para 2011-2015, por ex., na pág. 9, ele próprio escreve textualmente o seguinte: “Quero concluir fazendo um ponto que julgo de grande importância. A consolidação orçamental e a diminuição ordeira do endividamento são incontornáveis. São condições necessárias para retomar uma trajetória de prosperidade crescente em Portugal”..
No entanto, nem ele próprio acredita no que o diz e escreve. No Relatório do Orçamento do Estado para 2012, que acompanha a proposta de Lei do OE-2012, na pág. 240, num anexo denominado “Relatório sobre a Sustentabilidade Financeira da Segurança Social”, encontra-se um gráfico, que a seguir se apresenta, com a  previsão do crescimento da economia portuguesa (PIB) para o período 2011-2050, elaborada pelo governo anterior de Sócrates, que constava do OE-2011 (as barras a  cinzento), e uma outra previsão feita pelo governo de  Vítor Gaspar (as barras a azul). Esse gráfico, elaborado pelo governo desmente tudo aquilo que Vítor Gaspar anda a dizer continuamente. O próprio ministro desmente-se a si próprio.
Gráfico 1
Taxas de crescimento da economia portuguesa (PIB) prevista pelo
governo de Passos Coelho para o período 2011-2050

FONTE : Relatório sobre a Sustentabilidade Financeira da Segurança Social anexo ao Relatório do Orçamento do Estado para 2012 (pág. 240)

Como revela o gráfico 1, o governo de Passos Coelho prevê que a economia portuguesa (PIB) cresça, em média, 0,4% no período 2011-2015; 1,1% no período 2016-2020; 1,8% no período 2021-30; 1,5% no período 2031-40; e 1,2% no período 2041-50.  A média destas taxas dá uma taxa de crescimento do PIB de apenas 1,2% por anos para o período 2011-2050. E como a experiência já mostrou a realidade é sempre pior do que as previsões do governo por isso o crescimento será certamente inferior ao previsto pelo governo.
Mas mesmo com uma taxa média de crescimento no período 2011-2050 de apenas 1,2% ao ano, como é que se pode falar de uma “trajectória de prosperidade crescente em Portugal”? Se existisse um mínimo de honestidade intelectual afirmações como aquelas, que objectivamente visam manipular a opinião pública e enganar os portugueses não podiam nem deviam ser feitas.
Para que se possa ficar com uma ideia clara das consequências destas taxas de crescimento económico, basta analisar os seus efeitos sobre o desemprego, que é uma dimensão extremamente importante para todos os portugueses. A experiencia mostra que, em Portugal, o desemprego aumenta de uma forma rápida quando a taxa de crescimento económico (PIB) diminui, e continua a crescer enquanto a taxa de crescimento do PIB se mantém muito baixa, como mostra o gráfico seguinte construído com dados oficiais referentes às taxas decrescimento do PIB e do desemprego em Portugal nos últimos 16 anos (1996-2012). .
Gráfico 2
Relação entre o crescimento económico (PIB) e o desemprego em Portugal

FONTE: 1996-2010: Eurostat. 2011-2012: PIB: Eurostat; Taxa de desemprego: Relatório OE-2012

Como revela o gráfico, em Portugal a taxa de desemprego aumenta logo que o crescimento económico (PIB) diminua abaixo do 2% (isso aconteceu a partir de 2001 como mostra o gráfico). Só com um crescimento superior a 2% é que a taxa de desemprego começa a diminuir.

E o que prevê o ministro das Finanças e o próprio governo de Passos Coelho para Portugal no período 2011-2050?  Um crescimento económico que, em média, rondará apenas 1,2% por ano. E como mostra a experiencia, que se encontra plasmada no gráfico 2 construído com dados oficiais, com as taxas de crescimento como as previstas pelo actual governo para o período 2011-2050, a taxa de desemprego em Portugal, que já atinge valores inaceitáveis, continuará a aumentar de uma forma continua. É esta a “trajectória de prosperidade crescente” de que fala o ministro das Finanças, que certamente a política de destruição da economia e da sociedade portuguesa levada a cabo pelo actual governo inevitavelmente conduzirá, sendo até muito provável que a situação no futuro, a continuar esta politica, ainda seja mais grave que os dados oficiais do gráfico 2 mostram.   

O EMPOBRECIMENTO CONTINUADO DO PAÍS E O AUMENTO DA MISÉRIA EM PORTUGAL

Apesar do próprio governo prever no Relatório do Orçamento do Estado para 2012 um agravamento da taxa de desemprego (12,5% em 2011, e 13,4% em 2012), mesmo assim a verba constante da proposta do Orçamento da Segurança Social para 2012 para pagar subsídios de desemprego não aumenta, até diminui. De acordo com o quadro III.3.23, que consta da pág. 93 do Relatório do OE-2012, o governo estima gastar, em 2011, com o pagamento de subsídios de desemprego 2.067,35 milhões € e, em 2012, apenas 2.046,36 milhões €. Portanto, o desemprego vai aumentar segundo o próprio governo, mas o apoio aos desempregados diminui. E isto é ainda mais grave, se se tiver presente que o numero oficial de desempregados já é superior a 696 mil segundo o INE, mas o numero de desempregados que, em Setembro de 2011, recebiam subsidio de desemprego eram apenas 296.336 segundo a Segurança Social, o que correspondia a uma taxa de cobertura de somente 42,6%, portanto mais de metade do número oficial de desempregados já não recebe subsidio de desemprego. E recorde-se que o desemprego real (1.018,5 mil calculado com base nos dados do INE) é ainda muito superior ao desemprego oficial. Por outro lado, segundo também o INE, no fim de 2009 (e a situação actual ainda é mais grave), mais de 43 em cada 100 portugueses (4.600.000 no país) cairiam no limiar da pobreza se não existissem as “transferências sociais”. Ao aumentar o desemprego como é previsível se actual politica continuar, e ao reduzir o numero de desempregados a receber o subsídio de desemprego, ou seja, as transferências sociais, como tem acontecido até aqui (entre Jan-2010 e Set-2011, passou de 370.658 para 296.336, ou seja, diminuiu em 74.322), e como o governo de Passos Coelho tenciona continuar a fazer, mas de uma forma mais drástica para reduzir o défice orçamental, é inevitável que a miséria aumentará.

É cada vez mais claro que as politicas erradas impostas a nível da U.E. estão a conduzir esta, e os países que a integram, ao declínio e ao aumento da pobreza. É já altura de inverter a situação.  
Eugénio Rosa , Economista, 6.11.2012

domingo, 26 de junho de 2011

A RESPONSABILIDADE DOS BANQUEIROS PELA CRISE QUE PORTUGAL ENFRENTA, E PELO ACTUAL ESTRANGULAMENTO FINANCEIRO DAS EMPRESAS

Estudo da responsabilidade do economista Eugénio Rosa
Resumo deste Estudo


(clicar nos quadros para aumentar)

Em Portugal, a concentração bancária é muito superior à média da U.E. Segundo o Banco de Portugal, em 2009, os cinco maiores bancos a operar no nosso País controlavam mais de 70% do valor dos “activos” de todos os bancos, quando na U.E. os cinco maiores bancos controlavam, em média, em cada país 42% dos “activos”.Este poder já enorme dos cinco maiores bancos é ainda aumentado pela posição dominante que também têm nos outros segmentos de mercado do sector financeiros (seguros; fundos de pensões; fundos de investimento mobiliário; fundos de investimento imobiliário; e gestão de activos). Esta situação, associada ao facto de uma parte importante do capital dos 4 maiores bancos privados já pertencer a grandes grupos financeiros internacionais, dá-lhes um imenso poder sobre o poder politico e sobre todo o processo de desenvolvimento em Portugal, condicionando-o de acordo com os seus interesses
A banca é um negócio “especial”, pois os banqueiros negoceiam fundamentalmente com dinheiro alheio obtendo assim elevados lucros. Segundo o Banco de Portugal, em Dezembro de 2010, o valor de todos os “Activos” da banca a operar em Portugal atingia 531.715 milhões €, enquanto os chamados “Capitais Próprios” da banca, ou seja, o que pertencia aos seus accionistas, somava apenas 32.844 milhões €, isto é, correspondia a 6,2%; por outras palavras, o valor dos Activos era 16,2 vezes superior ao valor do “Capital Próprio” dos “Activos”. Este rácio revela o elevado grau de “alavancagem” existente no sistema bancário em Portugal que permite aos banqueiros obter elevados lucros com pouco capital próprio (o que lhes pertence).
A banca a operar em Portugal está descapitalizada devido a uma elevada distribuição de lucros (o mesmo sucede com a EDP e PT, por ex.). Mesmo em plena crise os banqueiros não se coibiram de o fazer. Segundo o Banco de Portugal, no período 2007-2010, os lucros líquidos da banca, depois do pagamento dos reduzidos impostos a que está sujeita, somaram 8.972 milhões €. Entre Dezembro de 2007 e Dezembro de 2010, os Capitais Próprios da banca aumentaram apenas 4.571 milhões €. Apesar de redução de “Capitais Próprios” em 2008, uma parte dos 4.401 milhões € de lucros líquidos restantes foram distribuídos. E isto é reforçado quando o aumento de “capital” foi também conseguido através de novos accionistas. O Fundo de Garantia de Depósitos, cujo provisionamento é da responsabilidade da banca, está também subfinanciado (pensa-se em 15.000 milhões €). Este fundo é referido no ponto 2.15 do “Memorando”

Fala-se muito da divida do Estado, mas segundo o Banco de Portugal, a banca devia, em Dez-2010, 49.157 milhões € ao BCE e 81.125 milhões € a outros bancos, ou seja, 130.282 milhões €.
A banca em Portugal está profundamente fragilizada. A prova disso é que ela é incapaz de se financiar nos “mercados internacionais” sem a ajuda (o aval do Estado). A banca é também incapaz de financiar a economia, agravando a crise e o desemprego. Entre Dez-2009 e Dez-2010, o crédito em Portugal diminuiu em 1.965 milhões €, apesar dos depósitos na banca terem aumentado em 12.080 milhões €. A continuar, milhares de empresas entrarão em falência fazendo disparar ainda mais o desemprego. A agravar tudo isto está a exigência de “desalavancagem do sector bancário” constante dos pontos 2.2 e 2.3 do “Memorando”. O “rácio” de transformação na banca (quociente entre o credito liquido a clientes e os depósitos) é considerado pelas agências de “rating”, pelo FMI e pelo BCE como sendo muito elevado, e estão a pressionar o governo e o Banco de Portugal para que desça. Entre Dez.2009 e Dez.2010, o “rácio” de transformação diminuiu de 146% para 138%, ou seja, a banca reduziu o crédito de 1,46€ para 1,38 € por cada um euro de depósitos. A redução para 120%, como exigem as agências de “rating”, reduzirá ainda mais a capacidade da banca para financiar a economia, agravando a crise.
Esta situação é agravada pela profunda distorção da politica de crédito dos banqueiros na busca de lucros fáceis e elevados, responsável também pela actual crise. Entre 2000 e 2010, o crédito a habitação aumentou em 156%; o crédito ao consumo subiu em 137%; mas o crédito à actividade produtiva (agricultura, pescas e industria transformadora) cresceu apenas em 41%. Em Dez.2010, o crédito à actividade produtiva representava apenas 5,5% do credito total, enquanto à habitação atingia 34,6%, à Construção e Imobiliário 12,6% e ao Consumo 4,9%. E tenha-se presente que a banca financiou o crédito à habitação, que é um crédito a longo prazo (30-40 anos), com empréstimos a curto e médio prazo, pois não possui meios financeiros próprios. E como não consegue novos financiamentos para os substituir, as dificuldades da banca crescem, e corta ainda mais no crédito. No “Memorando de entendimento” estão 2 medidas: (1) O Estado conceder avales à banca até 35.000 milhões para esta se poder financiar; (2) O Estado endividar-se até 12.000 milhões € para reforçar o capital da banca. Mas isto é só admissível se o Estado controlar os bancos que forem apoiados, até porque a situação difícil que vive a banca “portuguesa” é consequência também da má gestão dos banqueiros, e deixá-los à “solta”,é permitir que continuem uma politica que tem sido nefasta para o País e para os portugueses.Os banqueiros em Portugal têm procurado fazer passar a mensagem junto da opinião pública que não têm qualquer responsabilidade pela grave crise económica que o País enfrenta, já que ela resultaria da crise internacional e das más politicas governamentais seguidas no passado de que eles não tiraram qualquer proveito. Tem-se assistido, desta forma, a uma autêntica operação de branqueamento e de desresponsabilização dos banqueiros, procurando fazer crer a opinião pública que eles são diferentes e muito melhores do que os banqueiros dos outros países. E como têm apoios e defensores poderosos nos principais media essa mensagem tem sido repetida até a exaustão procurando que, de tanto repetida, acabe por ser aceite como verdadeira pela opinião pública. Por isso, interessa analisar de uma forma objectiva o que tem sido a politica da banca em Portugal nos últimos anos, como ela contribuiu para a crise actual, e como está a estrangular financeiramente as empresas, o que determinará o aumento significativo do desemprego. Nessa análise utilizar-se-á dados oficiais indicando ao leitor as fontes.

O GRAU DE CONCENTRAÇÃO BANCÁRIA EM PORTUGAL É MUITO SUPERIOR À MÉDIA DA U.E.

O gráfico I, consta do Relatório de Estabilidade Financeira divulgado em Maio de 2011 pelo Banco de Portugal.
Em 1997, o valor dos “Activos” dos cinco maiores bancos a operar em Portugal já representavam cerca de 46% dos “activos” de toda a banca no nosso País, enquanto nos países da U.E. os cinco maiores bancos detinham, em média, 37% do valor dos “Activos” da banca de cada um dos países. Em 2009, essa percentagem dos cinco maiores bancos a operar em Portugal já tinha aumentado para cerca de 70%, enquanto nos países da União Europeia, os cinco maiores bancos de cada um dos países da U.E. controlavam em média, no mesmo ano, apenas 42% do valor total dos “activos” bancários desses países. Em 2009, o grau de concentração bancária em Portugal era 66% superior à média dos países da União Europeia. Esta elevadíssima concentração bancária no nosso País, muito superior à verificada nos restantes países da U.E., dá, aos cinco maiores bancos a operar em Portugal (CGD, o MIllennium BCP, o BES, o Santander-Totta e o BPI), um imenso poder que lhes permite condicionar o poder politico e todo o processo de desenvolvimento no nosso País. Apesar do “Memorando do FMI-BCE-CE constar já “a definição de um calendário mais ambicioso para a venda do negócio segurador do grupo Caixa (Fidelidade-Mundial e Império-Bonança), e de um programa para a alienação gradual de todas as subsidiárias non core e, se necessário, de uma redução das actividades no estrangeiro” (ponto 2.5), Passos Coelho, em declarações a jornais estrangeiro, já veio dizer que pretende “ir mais longe”, ou seja, privatizar ainda mais o que, a concretizar-se, só poderá determinar o aumento do domínio da economia e da sociedade portuguesa e, consequentemente, todo o processo de crescimento e de desenvolvimento em Portugal pelos grupos financeiros como, o que já existe, ainda não fosse suficiente. Isso só poderá agravar ainda mais as dificuldades actuais.

OS CAPITAIS DOS BANQUEIROS APENAS REPRESENTAM 6% DO VALOR DOS ACTIVOS DA BANCA, TUDO O RESTO É CAPITAL ALHEIO QUE NÃO PERTENCE AOS ACCIONISTAS DA BANCA

A maior parte do capital que está na banca não pertence aos proprietários (accionistas) dos bancos. Apenas uma pequena percentagem é que lhes pertence, os chamados “Capitais Próprios”.


No período 2007-2009, os “Capitais Próprios” da banca a operar em Portugal representavam uma pequena percentagem dos seus “Activos” – em média 6,1%-o que significa que ela vive fundamentalmente de capitais alheios, que não pertence aos banqueiros. Dito de outra forma, em média por cada 100 euros de “Activos” (e “Activos” corresponde aquilo que banca possui mais aquilo que tem a receber), apenas 6,1 euros pertencem aos “banqueiros”. Esta elevada “alavancagem” (Activos em média 16,5 vezes superiores aos Capitais Próprios) têm permitido aos banqueiros gerirem um gigantesco volume de capitais alheios em seu proveito, ou seja, com objectivo de obter elevados lucros. Em Dezembro de 2010, segundo o Banco de Portugal, o capital alheio gerido pela banca em Portugal atingia o gigantesco montante de 498.907 milhões € (2,8 vezes o PIB português), enquanto os “Capitais Próprios”, ou seja, o que pertencia aos accionistas da banca era apenas de 32.844 milhões € (6,2%).

A BANCA EM PORTUGAL ESTÁ PROFUNDAMENTE DESCAPITALIZADA DEVIDO À MAIOR PARTE DOS LUCROS NÃO SEREM INVESTIDOS MAS DISTRIBUIDOS PELOS ACCIONISTAS

O quadro seguinte, construído com dados dos Relatórios de Sustentabilidade Financeira do Banco de Portugal, mostra que os banqueiros têm descapitalizado a banca a operar em Portugal.


Mesmo em plena crise os banqueiros não se coibiram de descapitalizar a banca. Segundo o Banco de Portugal, no período 2007-2010, os lucros líquidos da banca depois do pagamento de impostos atingiram 8.972 milhões €. Mas os “Capitais Próprios” da banca, durante este período, aumentaram somente em 4.571 milhões €, sendo a diferença de 4.401 milhões €. Portanto, apesar da redução verificada nos “Capitais Próprios” em 2008, uma parte daquela diferença de 4.401 milhões € de lucros líquidos foram distribuídos aos accionistas. E tal conclusão é ainda reforçada pelo facto de nos poucos aumentos de capital que se registaram participarem novos accionistas.

A BANCA A OPERAR EM PORTUGAL ESTÁ PROFUNDAMENTE ENDIVIDADA E SEM CAPACIDADE PARA FINANCIAR A ECONOMIA

O crédito em Portugal tem diminuído o que tem contribuído para o estrangulamento financeiro das empresas, estando já a pôr em causa a própria sobrevivência de muita delas.


Entre Dez-2009 e Dez-2010, o crédito diminuiu em Portugal em 1.965 milhões €, apesar dos depósitos e outros empréstimos dos clientes à banca terem aumentado em 12.080 milhões €. Isto resultou do facto da estar a ser pressionada quer pelas empresas de”rating” quer pelo FMI e BCE para diminuir o seu “rácio” de transformação (quociente do valor do crédito a dividir pelos recursos de clientes). Efectivamente, entre Dez.2009 e Dez.2010, a banca reduziu esse “rácio” de 146% para 138%, ou seja, reduziu o crédito de 1,46 € para 1,38 € por cada euro de depósitos. E futuramente terá de reduzir ainda mais, pois a pressão externa (agências de “rating”, FMI e BCE) é que desça para 120% a fim de fazer desalavancagem do sector bancário”. Estando a banca descapitalizada, e os banqueiros não querendo ou não tendo meios para capitalizar a banca, a “solução” será reduzir ainda mais o crédito, nomeadamente à economia, o que, o que só poderá levar à falência muitas mais empresas, e ao aumento ainda mais rápido do desemprego. O aumento do rácio de capital – Tier 1 – para 9% em 2011 e para 10% em 2012, imposto pela “troika” à banca, está a determinar um maior domínio da banca pelo capital estrangeiro, pois é este que está a participar mais nos aumentos de capital. E como tudo isto já não fosse suficiente o FMI-BCE-BdP irão fazer uma análise do crédito concedido pelos bancos mais importantes o que poderá levar à detecção de “esqueletos”, aumentando as dificuldades da banca e, consequentemente, do financiamento à economia.

A POLITICA DE CRÉDITO DA BANCA CONTRIBUIU TAMBÉM PARA A GRAVE CRISE ACTUAL

Movidos pela avidez de lucros fáceis e rápidos, os banqueiros portugueses levaram a cabo nos últimos anos uma politica de crédito distorcida e profundamente danosa para o País.



Entre Dez.2000 e Dez.2010, o crédito à actividade produtiva (agricultura e indústria transformadora) aumentou apenas 41,2%, enquanto à “Construção e actividade imobiliária” cresceu 127,5%; à “Habitação” em 156,8%; e ao “Consumo” subiu 137,4%. Esta politica de crédito imposta pela banca e danosa para o desenvolvimento do País determinou que, em Dez.2010, o crédito à actividade produtiva representasse apenas 5,5% do credito total (em 2000, correspondia a 7,7%), enquanto o crédito à “Construção e actividade imobiliária” representasse 12,6%, à “habitação” 34,6% e ao “Consumo” 4,9% do credito total. E os banqueiros e os seus defensores ainda têm descaramento de dizer que não têm culpas na grave crise que enfrenta o País e que são diferentes, para melhor naturalmente, do que os banqueiros de outros países? A avidez de lucros elevados e fáceis, e a má gestão também caracteriza a gestão da banca em Portugal, o que contribuiu para a gravidade da crise actual e para os problemas que a banca enfrenta actualmente.

É NECESSÁRIO QUE O ESTADO CONTROLE A BANCA QUE APOIE PONDO-A AO SERVIÇO DO PAÍS

Os bancos que operam em Portugal estão profundamente endividados, descapitalizados, fragilizados e incapazes de obter financiamentos externos para financiar a economia. No “Memorando de entendimento”, estão previstos 35.000 milhões de euros para avales do Estado à banca para esta poder obter financiamentos; e 12.000 milhões de euros para aumentos de capital da banca à custa do endividamento do Estado. Embora as dificuldades da banca sejam neste momento enormes, pondo em causa o próprio financiamento da economia e das famílias, o apoio do Estado mesmo nestas condições só seria admissível se passasse a controlar, por ex. através da participação maioritária no capital dos bancos que apoiasse, e a pôr esses bancos ao serviço do desenvolvimento do País pois, se isso não acontecer, é de prever que a politica dos banqueiros que contribuiu também para o estado a que o País se encontra continue. Como a experiência já provou, eles estão mais interessados em obter lucros rápidos e fáceis, mesmo que isso seja à custa do desenvolvimento e da criação de condições geradoras de graves crises económicas e sociais com consequências dramáticas (estagnação, recessão, desemprego, desigualdades e da pobreza).


Eugénio Rosa, Economista, 22.6.2011

domingo, 12 de junho de 2011

Portugal: um balanço de 20 anos na União Europeia

Eugénio Rosa

Portugal aderiu à União Europeia (UE) em 1986, portanto, em 2006, completam-se 20 anos. É altura de se fazer um balanço objectivo, naturalmente diferente do balanço oficial, que neste artigo se vai limitar, até por uma questão de espaço disponível, a alguns aspectos importantes da realidade económica e social, ou seja, tentar saber o que essa adesão trouxe de bom e mau para o nosso país neste campo. E mais ainda quando na altura da adesão se fizeram promessas ao povo português de que ela traria desenvolvimento, crescimento económico, mais emprego, maior nível de vida, mais riqueza e mais justiça. Estas foram as promessas que os sucessivos governos quer do PS (o primeiro foi o de Mário Soares) quer do PSD (o primeiro foi de Cavaco Silva), que se alternam de uma forma pendular no poder, utilizaram abundantemente para justificar essa adesão.
Nestes 20 anos, Portugal recebeu fundos da UE que rondaram os 50 000 milhões de euros (o correspondente a 10.024,1 milhões de contos a preços correntes). Mas as questões que imediatamente se colocam são as seguintes: que vantagens obteve com tal adesão? E qual o preço que pagou e está a pagar por aqueles milhões de euros que ofuscaram e continuam a ser utilizados para ofuscar a consciência de muitos portugueses?Mesmo a nível de transportes, onde os investimentos elevados foram realizados com o apoio de fundos comunitários, mesmo aqui, repetimos, ao se optar preferencialmente pelo transporte rodoviário (construção de auto-estradas, pontes e viadutos), e ao se investir de uma forma insuficiente ou mesmo a desinvestir no transporte ferroviário criaram-se graves distorções a nível de todo o sistema de transportes com consequências muito pesadas quer no aumento da dependência energética do País quer em termos de ineficiência energética. Esta distorção, já se está a pagar pesadamente, como no caso do aumento significativo da factura energética, o que está a contribuir para o grave desequilíbrio das contas externas do País, muito mais grave que o défice orçamental.
A destruição do aparelho produtivo nacionalMas onde as consequências foram mais dramáticas para Portugal foi a nível da destruição do seu aparelho produtivo, como provam os dados oficiais constantes do quadro I.

Assim, a partir de 1985, verificou-se uma destruição gradual mas permanente da agricultura, das pescas e da indústria transformadora que são fundamentalmente os sectores produtivos de bens transaccionáveis, ou seja, aqueles que eventualmente podem ser exportados. Assim, entre 1985 e 2003, o peso que estes sectores representam no valor da riqueza nacional criada anualmente, baixou de 34,8% para apenas 22,4%, ou seja, sofreu uma quebra de 35,6%.A mesma redução verificou-se no emprego em sectores produtivos de bens transaccionáveis. Entre 1985 e 2003, o emprego na agricultura, silvicultura, pescas e indústria transformadora passou de 40,5% para apenas 29,1% do emprego total do país. Isto significou uma redução do emprego que estes sectores representam em relação ao emprego nacional em mais de 28%.Esta destruição tão significativa dos sectores que, por excelência, são produtivos, associada à destruição do Sector Público Empresarial, através de um processo de privatizações selvagem, levado a cabo pelos governos do PSD de Cavaco Silva e do PS de Guterres, colocou as empresas mais importantes sob o controlo de grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros, mais interessados em acumular lucros gigantescos que no desenvolvimento do país. Para além disso, e como confirma o relatório de 2003 do PRIME, que é um programa cofinanciado pela UE, que tem como objectivo a modernização da economia portuguesa, cerca de 80% do investimento apoiado por este programa que é realizado pelas empresas portuguesas destinam-se a tirar partido da mão-de-obra barata ou de recursos nacionais, o que significou que os fundos comunitários têm sido, na sua maioria, utilizados para perpetuar um modelo de crescimento económico que está esgotado, e que só poderia conduzir o país à grave crise que enfrenta actualmente.Tudo isto teve como consequência a perda de competitividade da economia portuguesa e, consequentemente, o aumento vertiginoso do défice da nossa Balança Comercial. A destruição do sector empresarial do EstadoCom a adesão à UE, mas nomeadamente com a sua integração na União Monetária e consequente substituição da nossa moeda nacional pelo euro, Portugal perdeu importantes instrumentos de política macroeconómica que passaram para a competência do Banco Central Europeu ou da Comissão Europeia. Assim, Portugal deixou de ter competência para fixar taxas cambiais e as taxas de juro que passaram para a competência do Banco Central Europeu. Portugal também deixou de poder fixar livremente o défice orçamental adequado ao desenvolvimento do nosso país, que passou para a UE. O mesmo sucede em relação aos investimentos, nomeadamente os maiores e estruturantes, que passaram a ser condicionados pelo cofinanciamento comunitário. Desta forma Portugal ficou indefeso perante situações de grave crise económica e social como é aquela que enfrenta actualmente.Um dos instrumentos que poderia no entanto ser utilizado para contrabalançar esta perda de importantes instrumentos de política macroeconómica, seria a existência de um forte Sector Empresarial do Estado, que poderia e deveria ser utilizado para levar a cabo uma política planeada de desenvolvimento do país. Efectivamente, se o Estado possuísse as maiores e principais empresas estratégicas (do sector bancário, segurador, telecomunicações, energia, etc.) poderia utilizá-las como instrumentos de uma política económica ao serviço do país.Mas o que sucedeu foi precisamente o contrário. Primeiro, os governos do PSD de Cavaco Silva e depois os governos do PS de Guterres, baseados no falso argumento de que era necessário melhorar a concorrência e desenvolver centros de decisão nacionais, procederam à privatização selvagem e maciça das principais empresas públicas, entregando a sua propriedade a grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros.Orientados por uma fúria privatizadora, onde os interesses nacionais estiveram totalmente ausentes, os governos do PSD iniciaram a privatização das principais empresas públicas, tendo entregue ao controlo total ou parcial de grandes grupos económicos 36 empresas pertencentes aos sectores da comunicação social, bancário, segurador, cervejeiro, de transportes, pasta de papel, energia, adubeiro e cimenteiro, que antes pertenciam ao Estado.Mas foi fundamentalmente com o governo de Guterres, e com a dupla Guterres-Pina Moura que se procedeu a uma onda maciça de privatizações de empresas públicas, muitas delas com contornos duvidosos.Assim, de 1996 a 2001, foram privatizadas, parcial ou totalmente, as maiores empresas públicas (Companhia Nacional de Petroquímica, Portugal Telecom, Cimpor, Banco Totta & Açores, Tabaqueira, Banco Comercial dos Açores, BFE, EDP, BRISA, Quimigal, Setenave, Galp), o que determinou que as principais empresas portuguesas, que antes eram públicas, passassem para o controlo dos grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros.Guilherme de Oliveira Martins, o ministro das Finanças do último governo de Guterres, gabou-se dessa obra no prefácio que escreveu ao estudo da Secretaria do Estado do Tesouro e Finanças que tem o título «Sector Empresarial do Estado: evolução no período 1996-2001», com as seguintes palavras: «no período compreendido entre 1996 e 2001, ou seja com governos PS, obteve-se “um encaixe de 15.919,8 milhões de euros” “com as privatizações quando “no período 1989-1995”, ou seja, com governos PSD, «o encaixe tinha sido de 6.827,3 milhões de euros, correspondentes na sua generalidade às operações de privatizações do sector bancário e segurador». E acrescentava com uma certa euforia: «o encaixe total obtido no período 1996-2001 (com governos PS) é revelador não só da decisão política de intensificação das operações de privatização como uma das principais transformações estruturais da economia portuguesa».Esta destruição do sector empresarial do Estado pelos governos do PSD e do PS teve consequências desastrosas para o país. A grave crise económica e social que Portugal enfrenta neste momento é também uma consequência desta política antinacional levada a cabo por estes governos. Efectivamente, Portugal ao ter de transferir os principais instrumentos de política macroeconómica para a UE, e não possuindo já um importante Sector Empresarial do Estado para poder pôr em prática uma política de crescimento económico e desenvolvimento que o país necessita, enfrenta crescentes dificuldades para ultrapassar crises como aquela que está a viver.E a situação ganha foros de escândalo quando os grupos económicos que dessa forma obtiveram a propriedade e controlo dessas empresas, mesmo em plena crise do país e das dificuldades da generalidade dos portugueses, conseguem obter, pelo facto de controlar essas empresas que antes eram públicas, lucros nunca vistos. Assim, de lucros, em 2005, a EDP obteve cerca de 1000 milhões de euros, a PT cerca de 600 milhões de euros, a banca obteve lucros que em alguns casos foram superiores em cerca de 90% aos alcançados em 2004, que já tinham sido bastantes elevados; o mesmo aconteceu com o sector segurador, etc., etc.. O capital predador, de que são exemplos a OPA da Sonae sobre a PT e do BCP sobre o BPI que não acrescentam nada ao tecido produtivo nacional, mercê da política de privatizações dos governos do PSD e do PS, comanda neste momento os destinos do país.Baixo nível de escolaridade e de qualificaçãoA riqueza de um país mede-se também pelo nível de escolaridade e de qualificação dos seus habitantes. As pessoas são a riqueza mais importante de um país, sem o que não é possível qualquer processo rápido de crescimento económico e de desenvolvimento.E durante estes 20 anos de adesão à UE os resultados neste campo fundamental para o país e para os portugueses foi um desastre, como provam os dados oficiais constantes do quadro II.


De acordo com dados da OCDE, entre 1991 e 2002 a população portuguesa com o ensino básico ou menos diminuiu somente 6 pontos percentuais, pois passou de 86% para 80%, enquanto a redução média nos países da OCDE atingiu 12 pontos percentuais pois passou de 45% para 33%, ou seja, o dobro do verificado em Portugal. E esta situação é ainda mais grave se se tiver presente que, em 1991, Portugal encontrava-se já numa posição muito mais desfavorável que a média dos países da OCDE (em 1991, 86% da população portuguesa tinha o ensino básico ou menos, enquanto a média na OCDE era de 45%), e que, em 2002, a média da OCDE tinha baixado para 33%, enquanto em Portugal a população com o ensino básico ou menos era ainda 80% do população total com idade entre os 25 e 64 anos. Em 2005, de acordo com os dados do INE, cerca de 72% da população empregada portuguesa possuía apenas o ensino básico ou menos; 18% o ensino secundário; e 12% o superior. É evidente que não é com este baixíssimo nível de escolaridade que Portugal poderá implementar um modelo de crescimento económico baseado em trabalho qualificado e bem pago. E não é o Plano Tecnológico, que tem constituído uma das bandeiras de propaganda do governo de Sócrates, que conseguirá garantir emprego à esmagadora maioria da população empregada que se sente ameaçada pelo desemprego.A desigualdade na repartição da riqueza continua a ser a mais grave da UEA adesão de Portugal à UE, mas nomeadamente à União Monetária, e como consequência do neoliberalismo que lhe está associado determinou o agravamento das desigualdades no nosso país, como mostram os dados do Eurostat constantes do quadro III.


Em primeiro lugar, Portugal é o país da UE onde a repartição do rendimento tem sido persistentemente mais desigual. Assim, em 2004, último ano em que o Eurostat divulgou dados sobre esta matéria, em Portugal os 20% mais ricos recebiam 7,2 vezes mais rendimento do que os 20% mais pobres da população, enquanto a média nos países da UE era, na mesma altura, de 4,8 vezes, portanto um valor inferior em 33% ao do nosso país.Depois, em relação a Portugal o valor de 2004 (7,2 vezes) é praticamente o valor de 1985 (7,4 vezes), o que mostra que desde que o país aderiu à UE não se verificou qualquer alteração significativa neste campo. Finalmente, se compararmos a situação portuguesa com a da Finlândia, um país altamente competitivo e com taxas de crescimento económico muito superiores à portuguesa, constata-se que sempre se verificou na Finlândia uma melhor repartição da riqueza (em 2004, os 20% mais ricos possuíam 3,5 vezes mais rendimento que os 20% mais pobres da população, que é menos de metade do valor registado em Portugal, que é 7,2 vezes), o que parece indiciar que a má distribuição do rendimento está associada também a baixas taxas de crescimento, verificando-se também o inverso: elevadas sustentadas taxas de crescimento estão associadas a melhores níveis de repartição da riqueza criada num país. Razão tem o PCP quando afirma que não é possível em Portugal um crescimento sustentado e elevado sem que simultaneamente se proceda a uma melhor repartição da riqueza e do rendimento. E isto é não só um imperativo social, face à generalização da pobreza coexistindo com uma minoria que acumula cada vez mais riqueza, mas também é uma necessidade económica.